Este ano, é obrigatório que as escolas brasileiras estejam habilitadas com materiais e profissionais capacitados para ensinar Educação Financeira. A decisão tomada pelo Ministério da Educação, em 2019, é uma medida pensada para que os alunos do ensino básico e médio se familiarizem com o tratamento correto do dinheiro antes mesmo de começar a trabalhar efetivamente.
Isso acontece pois em 2019, os brasileiros bateram um recorde não muito satisfatório para a vida financeira. Segundo o site do Serasa Experian, o número de inadimplentes em março do ano passado foi de 63 milhões, chegando a esse montante pela primeira vez na história. Isso mostra que mais de 40% da população está com dívidas atrasadas ou com o nome sujo.
Muitos especialistas atribuem o grande número de endividados não somente aos altos níveis de desemprego e instabilidade que o país atravessa, mas também à falta de educação financeira que os brasileiros enfrentam. Essa ausência de informações de como lidar bem com o dinheiro faz com que a população tome decisões pouco saudáveis, como adquirir muitos cartões de crédito, utilizar o cheque especial em demasiado e principalmente não poupar.
Essa junção de escolhas e o pouco conhecimento das demandas financeiras, faz com que muitos brasileiros decretem uma situação de “falência”: o superendividamento. De acordo com pesquisa realizada pelo SPC Brasil, o país tem mais de 30 milhões de pessoas superendividadas, que é quando o indivíduo não consegue pagar suas dívidas sem comprometer suas despesas essenciais.
Justamente pela crescente dessas situações, o Ministério da Educação deu uma prioridade para cumprir a lei aprovada em 2017, de forma a incluir a disciplina de Educação Financeira na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), para que todas as escolas do Brasil lecionem as diretrizes financeiras para crianças e adolescentes, evitando a médio e longo prazo, altos números de inadimplência e endividamento no país.
Traçando um panorama da situação financeira do Brasil, o professor de economia da PUC Minas, Jean Max Tavares, reforçou que a introdução da disciplina é fundamental já que o contexto atual não favorece uma perspectiva de melhora econômica. “A inclusão da Educação Financeira se faz bastante necessária no Brasil, haja vista que esse cenário é muito prejudicial para o comércio e, portanto, para o crescimento da economia.”, disse.
Segundo a BNCC, alguns dos pontos que serão debatidos nas aulas são taxas de juros, inflação, aplicação financeira e impostos. Além disso, a instituição afirmou em entrevista à revista Exame, que a disciplina vai desenvolver um estudo interdisciplinar considerando as “dimensões culturais, sociais, políticas e psicológicas, além da econômica, sobre as questões do consumo, trabalho e dinheiro”.
A importância de tratar outras questões que não somente o dinheiro é essencial para que crianças e adolescentes possam entender seu valor. O professor Jean acredita que a linguagem para tratar com os alunos de diferentes classes sociais deve ser considerada. “Em princípio, a realidade financeira dos alunos de escola pública não é tão boa quanto a de alunos de escolas privadas. Os conceitos relacionados ao uso adequado do crédito devem ser mais amplos e mostrados na prática”, explicou.
O dinheiro e a autoestima dos brasileiros
Outro dado presente na pesquisa realizada pelo SPC/Serasa também preocupa a população brasileira. Mais de 70% dos inadimplentes sofrem com ansiedade e distúrbios causados pela preocupação com a falta de dinheiro.
De acordo com o economista, em tempos de crise e instabilidade, as pessoas tendem a se sentirem frustradas, pois não conseguem organizar a vida financeira. “De forma frequente, sentimentos como esses somados à falta de perspectiva provocam desentendimentos familiares, causando acusações de parte a parte e, infelizmente, levam casais ao divórcio por falta de uma gestão correta do seu dinheiro, o que poderia ser aprendido desde a infância por meio da educação financeira”, concluiu o professor Tavares.
Os riscos do ensino
Infelizmente, sabemos que a situação do ensino público brasileiro é ainda muito precário. Segundo o exame Pisa, que mede o ranking mundial de educação, em 2018, o Brasil ocupou o 57º lugar entre 77 países que realizaram a prova. Logo, como a matéria de educação financeira será lecionada para que realmente tenhamos uma melhora a médio e longa prazo?
Conforme o economista, é necessário que haja um treinamento para que os professores possam repassar esses conceitos aos alunos. “Muitos professores da rede pública e privada não receberam essa educação financeira em algum momento de suas vidas, bem como preparação para ensinar os principais conceitos e a prática de forma pedagógica, já que a linguagem é bem específica.”, disse.
Além disso, Tavares reforça que é necessário que os professores tenham noção de que não é somente uma disciplina para lidar com o dinheiro. É preciso que saibam lidar com o lado emocional e com a definição dos objetivos de vida de cada aluno.